Quando se trata de biografias cinematográficas de figuras políticas, o equilíbrio entre capturar o impacto histórico e explorar a complexidade pessoal é crucial. Infelizmente, Reagan (2024), dirigido por Sean McNamara, falha miseravelmente em ambas as frentes. O filme tenta narrar a vida e a carreira do 40º presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, mas o resultado é um trabalho que se assemelha mais a um panfleto promocional do que a uma cinebiografia séria. Com uma direção problemática, um roteiro simplista e escolhas criativas desastrosas, Reagan é um exemplo perfeito de como não se abordar uma figura tão marcante e controversa.
Sean McNamara, cuja filmografia inclui projetos de qualidade questionável como Soul Surfer (2011), parece ter adotado uma abordagem superficial e quase reverencial. A direção é marcada por escolhas de mau gosto, como a narração em off feita por Jon Voight, que interpreta um soviético fictício com uma admiração bizarra por Reagan. Além disso, a decisão de "rejuvenescer" digitalmente Voight com um CGI de baixíssima qualidade transforma cada cena em que ele aparece em um espetáculo desconfortável e involuntariamente cômico. A tentativa de dar ao filme uma aura épica fracassa, e o que sobra é uma narrativa que parece mais um telefilme datado do que uma produção cinematográfica.
O roteiro, escrito por Howard Klausner (Cowboys do Espaço), pinta Reagan como uma figura quase divina, desprovida de falhas ou complexidades. Questões polêmicas, como o escândalo Irã-Contras, as críticas à sua gestão durante a crise da AIDS e os impactos negativos de suas políticas econômicas, são ignoradas ou mencionadas apenas de forma superficial. Em vez disso, o filme se concentra em momentos quase anedóticos, como sua infância em Illinois e sua transição de ator para político, sem oferecer insights significativos.
Um exemplo de má execução do roteiro é a forma como eventos históricos importantes são tratados. A queda do Muro de Berlim, por exemplo, é apresentada como um triunfo puramente pessoal de Reagan, ignorando as nuances geopolíticas e a contribuição de outros líderes como Mikhail Gorbachev. Essa simplificação não só desrespeita a história, mas também aliena espectadores que esperam um retrato mais honesto e equilibrado.
Se há um ponto positivo em Reagan, ele reside na performance de Dennis Quaid. O ator entrega uma interpretação dedicada, capturando com precisão os trejeitos, o tom de voz e o carisma que definiram Reagan como uma figura pública. Em cenas mais intimistas, como sua recuperação após o atentado que quase o matou, Quaid consegue transmitir a humanidade e a vulnerabilidade do presidente, elevando brevemente o nível do filme.
Penelope Ann Miller também merece menção como Nancy Reagan, trazendo uma sensibilidade genuína ao papel da primeira-dama. Sua química com Quaid é um dos poucos aspectos autênticos da produção. Infelizmente, o restante do elenco é amplamente desperdiçado, incluindo Alexey Vorobyov, uma escolha inexplicável para interpretar um papel de destaque (ele é um cantor russo revelado pelo festival de música Eurovision). Sua performance é desajeitada e contribui para a sensação de que o filme não sabe aonde quer chegar.
A trilha sonora de Reagan é um desastre por si só. Composta por Sean Callery (24), ela é genérica e frequentemente intrusiva, sublinhando emoções de forma tão exagerada que chega a distrair o espectador. Os efeitos visuais, especialmente os momentos que tentam recriar eventos históricos, são amadores e muitas vezes risíveis. Em um filme de 140 minutos, essas falhas técnicas tornam a experiência exaustiva.
A escolha de incluir cenas humorísticas sem propósito, como Reagan promovendo produtos na televisão durante os dias finais de sua carreira como ator, é emblemática do tom inconsistente do filme. Momentos como esse, que poderiam adicionar camadas ao personagem, acabam sendo tratados de forma tão cafona que perdem completamente o impacto. Além disso, o ritmo é arrastado, com uma duração injustificável de mais de duas horas que apenas acentua a falta de substância.
Existem filmes piores, mas Reagan é uma decepção retumbante. Para aqueles que consideram Ronald Reagan um herói pessoal ou político, o filme pode servir como uma celebração nostálgica, mas para qualquer um que busque veracidade histórica ou profundidade artística, ele falha em todos os aspectos. Dennis Quaid faz o possível para sustentar o projeto, mas nem mesmo seu esforço louvável consegue salvar um filme que parece mais uma propaganda cafona do que uma obra de cinema.
Em última análise, Reagan serve como um lembrete de que grandes figuras históricas merecem retratos cinematográficos à altura de sua complexidade. Este filme, no entanto, é uma caricatura simplificada, empacotada em um embrulho de mau gosto que dificilmente será lembrado como algo além de uma curiosidade frustrante.