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outubro 30, 2024

Pisque Duas Vezes (2024)

 


Título original: Blink Twice
Direção: Zoë Kravitz
Sinopse: Quando o bilionário de tecnologia Slater King conhece a garçonete Frida em sua gala de arrecadação de fundos, faíscas voam. Ele a convida para se juntar a ele e seus amigos nas férias dos sonhos em sua ilha particular. Noites selvagens se misturam com dias ensolarados e todos estão se divertindo. Ninguém quer que esta viagem acabe, mas à medida que coisas estranhas começam a acontecer, Frida começa a questionar a sua realidade. Há algo errado com este lugar. Ela terá que descobrir a verdade se quiser sair viva desta festa.


Em Pisque Duas Vezes (Blink Twice, 2024), Zoë Kravitz surpreende como diretora com uma visão visual marcante, repleta de saturação e de uma direção de arte que potencializa cada cena, ao mesmo tempo em que assume um estilo despretensioso e cheio de referências. A história gira em torno de Frida (Naomi Ackie), que visita uma misteriosa ilha em companhia de amigos e acaba se deparando com a figura enigmática de Slater King (Channing Tatum), um anfitrião excêntrico que os recebe em sua luxuosa mansão e revela intenções sombrias.

Visualmente, o filme é um deleite. A fotografia, que usa cores vibrantes e saturadas, cria um tom sinistro que, ao mesmo tempo, parece brilhar em um estilo quase pop. Este efeito de intensidade nas cores é cortesia da diretora de fotografia Charlotte Bruus Christensen, que emprega a paleta de tons quentes da locação, uma hacienda no México, com uma profundidade vibrante e saturada. Essa ambientação contribui para que a casa pareça quase um personagem próprio, com toques de elegância, mas que revelam uma falsidade no charme sofisticado do lugar, refletindo o caráter ambíguo de Slater​.

A trilha sonora merece destaque, oferecendo uma vibração descontraída e divertida, e serve como um alívio para os momentos tensos e os sustos. Kravitz parece ter usado a trilha para reforçar a natureza quase irônica do filme, colocando músicas leves em cenas que poderiam ser assustadoras. Isso também traz à tona o aspecto de “colagem” do filme: um mix de estilos e influências que remete a clássicos do horror e suspense, embora o faça de forma muitas vezes desconexa. No entanto, essa descontinuidade estilística tem o efeito surpreendente de tornar o filme envolvente, pois, ao misturar diferentes referências e clichês, mantém o espectador preso em uma jornada divertida e inesperada, em vez de buscar um sentido mais profundo ou uma narrativa coesa​.

A escolha de Kravitz como diretora é uma surpresa, pois muitos a conhecem por seu trabalho como atriz e cantora, além de ser filha do lendário músico Lenny Kravitz. A transição para trás das câmeras é inusitada, quase aleatória, mas ela acaba provando que consegue entregar um produto cativante, mesmo que não completamente original. Há uma leveza e uma autoconfiança na direção de Kravitz, como se ela não estivesse tentando provar nada, o que adiciona um charme peculiar ao filme. Este é um thriller que claramente não pretende ser levado muito a sério; ele aposta no entretenimento puro e é bem-sucedido em seu propósito descompromissado​.

Sobre o elenco, Channing Tatum interpreta o papel de Slater King, e sua atuação parece se alinhar bem ao que se espera dele: um personagem carismático e, ao mesmo tempo, raso. Ele encarna uma figura já bem explorada em outros filmes, quase uma caricatura de si mesmo, e Tatum parece confortável nessa posição familiar. Em contrapartida, Haley Joel Osment tem um retorno surpreendente e, para muitos, triste, pois ele se apresenta quase irreconhecível, longe do talento que exibiu em O Sexto Sentido e A.I.: Inteligência Artificial. Sua presença é uma lembrança de seu auge, e é lamentável vê-lo relegado a um papel menor e pouco exigente​.

Outro aspecto interessante é a escolha da locação. A mansão de Slater, uma hacienda mexicana, é transformada com adereços e designs criados para dar uma aparência misteriosa e decadente. Roberto Bonelli, o designer de produção, trouxe elementos florais marcantes, como flores tingidas com curry para criar um tom específico, transformando a mansão em uma espécie de armadilha elegante. Os detalhes e a meticulosa construção do ambiente ajudam a criar uma atmosfera tensa e desconfortável, onde o luxo é ameaçador. Esses cenários cuidadosamente preparados contribuem para que o espectador sinta que algo está sempre “errado” naquela casa​.

Pisque Duas Vezes pode não inovar em termos de narrativa e parece um compêndio de clichês de outros filmes de suspense, mas, ainda assim, diverte e mantém um tom irreverente e bem-humorado. O filme é uma colagem de cenas e estilos que, no final das contas, não precisam fazer muito sentido, pois o objetivo principal é entreter. Zoë Kravitz entrega um filme visualmente forte, repleto de atmosferas intensas e momentos engraçados, provando que às vezes o bom cinema pode ser apenas uma coleção de momentos agradáveis e despretensiosos, sem a necessidade de profundidade. Em resumo, é um filme que se diverte consigo mesmo, e, nesse sentido, também diverte o público.

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