Love, de Gaspar Noé, é um dos exemplos mais deploráveis de como o cinema pode perder seu rumo em nome de um suposto “experimentalismo” que, na verdade, se revela apenas como uma desculpa para a exibição gratuita e constante de cenas de sexo explícito. Não se enganem: não estamos falando de uma obra que utiliza o erotismo como parte de uma narrativa profunda ou provocadora, mas de uma produção que abandona qualquer tentativa de contar uma história coerente, focando unicamente em explorar o aspecto carnal sem nenhum propósito maior.
Desde o início, o espectador já é forçado a confrontar uma avalanche de cenas explícitas que, por si só, ultrapassam o limite do desconforto. E, em vez de oferecer alguma forma de introspecção sobre o relacionamento ou as emoções dos personagens, o filme transforma-se em um desfile interminável de atos sexuais. Sexo por sexo, sem um pingo de narrativa que justifique a presença dessas cenas. Não há enredo, não há desenvolvimento de personagens, e muito menos um motivo claro para que essas sequências estejam ali, a não ser chocar ou “chamar atenção” de forma barata.
Noé, conhecido por seu estilo visual arrojado, desta vez parece ter perdido completamente a mão. Enquanto em outros filmes, sua direção pode até ter causado impacto por seu visual perturbador e intenso, aqui essa abordagem é simplesmente preguiçosa e ofensiva. O 3D, que teoricamente deveria proporcionar uma experiência cinematográfica mais imersiva, é ridículo e absolutamente desnecessário. Utilizado apenas para acentuar cenas já grotescas, o efeito tridimensional parece uma piada de mau gosto, forçando o espectador a uma proximidade ainda mais desconfortável com um conteúdo que não mereceria sequer estar em uma tela convencional, quanto mais em uma sala de cinema equipada com essa tecnologia. Exibir este filme em 3D é um dos maiores absurdos já cometidos no cinema.
Ao longo das excruciantes duas horas de projeção, fica claro que o diretor decidiu abandonar qualquer tentativa de trabalhar com narrativa ou profundidade emocional. O filme não tem qualquer propósito dramático, não explora temas interessantes e muito menos consegue justificar sua existência como obra cinematográfica. O que se vê é um amontoado de cenas explícitas que não levam a lugar algum e não conseguem desenvolver nenhum arco significativo. A relação entre os protagonistas, que deveria ser o núcleo emocional da história, é rasa, insuportável e se dissolve em diálogos vazios e pretensiosos.
A tentativa de Noé de criar um filme que explore os altos e baixos do amor, as complexidades das emoções humanas ou os conflitos de relacionamentos fracassa miseravelmente. Tudo o que Love consegue fazer é reduzir esses temas a um pano de fundo para cenas que beiram a pornografia. Se havia alguma intenção artística ou poética por trás dessa abordagem, ela foi completamente obscurecida pela maneira grotesca e desnecessariamente explícita com que o diretor decide representar a intimidade. E de pensar que esse conteúdo ainda conseguiu ser exibido nos cinemas... é inimaginável.
Outro ponto a ser mencionado é a ausência de uma das características mais marcantes de Gaspar Noé: sua trilha sonora. Em produções anteriores, pelo menos, suas escolhas musicais, como o uso de french house, criavam uma atmosfera que, de certo modo, suavizava o impacto das cenas mais pesadas ou conferia algum dinamismo à narrativa. Aqui, nem isso! Não há absolutamente nenhum elemento sonoro que possa ao menos resgatar um fragmento de interesse no que está sendo apresentado na tela. A ausência de uma trilha minimamente interessante ou envolvente só aumenta a sensação de tédio e revolta.
A parte técnica do filme, que normalmente salva ou melhora uma experiência ruim, é também um desastre. A cinematografia, muitas vezes elogiada nos filmes anteriores de Noé, aqui parece ser usada apenas para servir ao objetivo de transformar o filme em uma desculpa visual para a exibição de corpos em situações gráficas. O enquadramento e o uso das câmeras são tão invasivos que chega a ser repulsivo, e o que poderia ser uma exploração estética de algo profundo e significativo é reduzido a um voyeurismo grosseiro.
Não há qualquer justificativa moral, artística ou social para que Love exista da maneira como existe. O filme é simplesmente repugnante em todos os aspectos. A ideia de que foi exibido em grandes festivais de cinema e em salas comerciais chega a ser ofensiva para o público e para o cinema como arte. Trata-se de uma obra que deveria ter sido vetada, não pela sua ousadia ou por tratar de temas tabus, mas pela sua absoluta falta de conteúdo e por sua abordagem vazia e exploradora.
Gaspar Noé já nos trouxe filmes controversos, mas nenhum deles desceu a um nível tão baixo quanto Love. Aqui, a única reação possível é a de indignação: um filme que deveria ser esquecido, apagado da história do cinema. Em última análise, Love não é nada além de uma experiência repulsiva, um atentado à paciência e à inteligência do espectador, que é forçado a testemunhar um espetáculo lamentável e sem propósito algum.
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