Gaspar Noé é um cineasta conhecido por seu estilo provocador, frequentemente desafiando os limites do que é aceitável ou confortável no cinema. Com Clímax (2018), ele oferece mais uma dessas experiências intensamente desconcertantes, que mistura drama e horror em uma narrativa visualmente agressiva e sensorialmente perturbadora. O filme segue um grupo de jovens dançarinos que, após um ensaio em um prédio isolado, acabam sendo drogados acidentalmente com LSD, o que leva a uma espiral de loucura e desespero. Embora Clímax tenha sido aclamado por sua abordagem visceral e ousada, é um filme que, além de ser exaustivamente caótico, fracassa em praticamente todos os aspectos, exceto, curiosamente, na trilha sonora, que é o único ponto positivo que se destaca.
Se existe algo que consegue salvar minimamente a experiência de Clímax é a trilha sonora. Gaspar Noé conseguiu reunir uma seleção musical que, por si só, é uma celebração do french house e do electro, incluindo faixas de Daft Punk e de Thomas Bangalter, membro do duo. A música eletrônica pulsante não apenas acompanha as cenas, mas quase se torna o próprio coração do filme, batendo freneticamente enquanto a narrativa se desenrola. Noé consegue transformar as batidas eletrônicas repetitivas em uma força hipnotizante que segura o espectador, mesmo quando a história e a direção parecem completamente fora de controle.
Destaque especial deve ser dado à música "What To Do" de Thomas Bangalter, que marca um dos momentos mais envolventes e frenéticos do filme. Enquanto as personagens começam a perder o controle e o caos se instala, o pulsar eletrônico cria uma tensão irresistível que parece empurrar o público para dentro desse pesadelo acidificado. Músicas como "Rollin' & Scratchin'" do Daft Punk também trazem uma energia vibrante, conduzindo a dança dos personagens, que, em seus primeiros momentos, ainda estão plenos de energia, mas que rapidamente descamba para um surto de violência descontrolada. Essa sensação de celebração inicial, que gradualmente se transforma em horror, é magistralmente acompanhada pela trilha, e é nesse aspecto que Clímax consegue realmente envolver o espectador.
Infelizmente, o elogio termina aqui. Embora a trilha sonora seja eletrizante e envolvente, o restante do filme se desfaz em uma sucessão de exageros visuais, atuações grotescas e uma narrativa que, se é que podemos chamar de tal, se perde em meio ao caos gratuito e à falta de propósito.
Visualmente, Clímax é exatamente o que se espera de Gaspar Noé: um filme cheio de planos-sequência que se alongam sem necessidade, movimentos de câmera frenéticos e uma estética que parece mais interessada em provocar repulsa do que em contar uma história. O filme começa com uma introdução promissora — uma dança coreografada lindamente filmada em um único take — que faz o público acreditar que está prestes a assistir algo grandioso. Mas, à medida que o filme avança, a estética se transforma em puro excesso.
Os movimentos de câmera de Noé, que inicialmente podem parecer inovadores e dinâmicos, logo se tornam cansativos. A câmera frequentemente gira de maneira vertiginosa, acompanhando os personagens enquanto suas mentes e corpos se desintegram. A intenção é clara: transmitir ao público o caos e a confusão das alucinações dos personagens. No entanto, o efeito é opressivo e, em vez de engajar, afasta. O espectador se vê menos imerso na história e mais interessado em se livrar da experiência desgastante que o filme oferece. O uso contínuo de ângulos invertidos e iluminação vermelha intensa transforma cada cena em uma sucessão de imagens desagradáveis, que parecem estar ali apenas para chocar, sem qualquer substância por trás.
Gaspar Noé é conhecido por seu estilo provocador, mas Clímax é um exemplo claro de quando a provocação ultrapassa o limite e se torna um exercício vazio de excentricidade. Cada elemento visual parece estar ali apenas para causar desconforto, sem uma verdadeira razão para existir dentro da narrativa. O uso repetitivo de cores vibrantes, principalmente o vermelho e o verde, soa excessivo e, com o tempo, banaliza o que deveria ser impactante.
A narrativa de Clímax é praticamente inexistente. O filme segue um grupo de dançarinos que, após uma festa, descobre que foram drogados. O resto da história é uma sucessão de colapsos psicológicos e físicos, com cada personagem sucumbindo de maneira grotesca e exagerada aos efeitos da droga. Noé se preocupa pouco em construir qualquer tipo de desenvolvimento de personagem ou de trama. Não há profundidade, não há nuances — apenas caos pelo caos.
Os personagens são deliberadamente unidimensionais, o que em outros filmes poderia ser uma escolha narrativa válida. No entanto, em Clímax, isso só amplifica a sensação de que estamos assistindo a uma experiência sem direção. Nenhuma das personagens tem motivações claras, e suas ações parecem ser guiadas apenas pelo desejo de Noé de empurrar o filme ao extremo. O resultado é um conjunto de figuras estereotipadas e caricaturais que, em vez de gerar empatia, causam irritação. Cada um deles cai em uma espiral de comportamento autodestrutivo, e a sensação é de que o público está apenas assistindo a um espetáculo grotesco e sem sentido, sem qualquer conexão emocional.
O filme tenta retratar a degradação humana, mas falha em dar qualquer contexto que torne essa degradação significativa. As situações absurdas e o comportamento extremo dos personagens não criam tensão; em vez disso, apenas geram frustração. Ao invés de torcermos por qualquer resolução ou alívio, apenas desejamos que o filme acabe logo.
Em última análise, Clímax é uma experiência exaustiva e vazia. Embora a trilha sonora seja excelente, especialmente para os fãs de música eletrônica e french house, o filme em si falha em todos os outros aspectos. Gaspar Noé parece mais interessado em chocar o público do que em criar uma narrativa coerente ou oferecer qualquer tipo de reflexão. O resultado é um filme que, embora visualmente agressivo, carece de profundidade ou substância. Ao final da sessão, o espectador se sente mais cansado do que impressionado, e a sensação que fica é de que Clímax poderia ter sido algo muito mais poderoso se não estivesse tão obcecado com seu próprio desejo de provocar.
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