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setembro 30, 2005

Crime Delicado (2005)

 


Título original: Crime Delicado
Direção: Beto Brant
Sinopse: Antônio Martins é um crítico teatral. Observador não somente de peças, mas também de pessoas, tem seus conceitos mudados quando conhece Inês, cuja personalidade é oposta à do crítico. Desinibida, Inês, que não tem uma perna, entra na vida de Antônio de forma a desestruturá-lo ao despertar uma paixão inédita no cínico e frio jornalista. Ela mantém uma relação ambígua com o pintor José Torres Campana (Felipe Ehrenberg), famoso por seus quadros eróticos que têm como modelo o próprio artista e a jovem. A relação desperta ciúmes doentio em Antônio e o conduz em uma espiral de ansiedade, ciúmes, perturbação e ilusão.


Por mais que todos estejam criticando bem o novo trabalho de Beto Brant, ele se mostra, na realidade, uma experiência de "como testar sua paciência em um cinema lotado". Desanimado pelo trailer, mas animado pela presença de Brant e do elenco na sessão de pré-estreia, me joguei dentro desse filme. E que tombo.

Gostaria de saber até quando o cinema brasileiro vai continuar tratando o sexo como um grande tema profundo a ser tratado. Já por essa premissa, Crime Delicado é mais do mesmo. Brant pode ser considerado cult por seus trabalhos anteriores (especialmente pelo já quase Hollywoodiano O Invasor), pode se sair muito bem em tramas policiais, mas, aventurando-se no terreno do drama, ou melhor, da nudez e sexo sem propósito nas telas, o diretor é um erro certo (se é que isso pode ocorrer).

Depois de muito tempo com cenas completamente desprezíveis e  desnecessárias, temos um bom momento em todo o longa, que é certamente nos diálogos do bar, sem conexão direta com a história, mas que ajudam numa "compreensão" do todo.

Todo o elenco (com exceção da estreante Lilian Taublib, que está ótima) parece estar lendo o script ali na sua frente. Falas decoradas, muitas frases de efeito, muitos palavrões. O antipático Marco Ricca não consegue conquistar o espectador em nenhum momento. Isso é ainda pior pois a redenção de seu personagem depende, mais no final da história, dessa empatia do público. É um filme nacional vazio, feito aos moldes de outros como Meu Tio Matou um Cara ou Sal de Prata no qual o sexo justifica tudo. É filme para pessoas que estão atrás de verem outras pessoas nuas na tela. E só.

Obviamente, como uma grande parcela das produções nacionais, Crime Delicado ainda conta com duas coisas extremamente desnecessárias: um final tão vazio quanto todo o filme e a presença irritante do "venerado" Matheus Nachtergaele, que tem o poder de estragar tudo onde põe o dedo. 

Enfim, nada funciona. Pior artisticamente, menos pior tecnicamente. Mas mesmo assim a tão dita fotografia "fenomenal" do filme se resume a planos e ângulos mais do que óbvios. Talvez tenham comentando tanto da fotografia porque existem alguns momentos em preto-e-branco no longa... e a crítica tem que elogiar, porque vocês sabiam que o rolo de filme preto-e-branco está pela hora da morte? Afinal, Brant precisa de boa bilheteria para comprar o leitinho das crianças. Mas, infelizmente, não vou contribuir para isso...

Claro, e por último, o tal "crime delicado" do título é um estupro. Que delicadeza (e sutileza), não é mesmo? E agora com licença, porque preciso ler a minha crítica em voz alta para todos aqui nessa sala vazia ficarem sabendo o que eu escrevi... aprendi essa técnica revolucionária de comunicação com o crítico Antônio (Marco Ricca). Obrigado, Crime Delicado. O que seria de mim sem esse filme?

setembro 26, 2005

ABC do Amor (2005)

 


Título original: Little Manhattan
Direção: Mark Levin
Sinopse: Gabe, um aluno de sexta série, é parceiro de Rosemary na aula de karatê. Apesar de conhecê-la há muito tempo, Rosemary de repente se torna sua primeira paixão. Em casa, os pais de Gabe, Adam e Leslie, estão esperando que o divórcio seja finalizado. Gabe e Rosemary começam a namorar, mas ela está indo para um acampamento em breve, ele entra em pânico. Suas tentativas de conquistá-la não funcionam, deixando-o confuso e infeliz.


Mark Levin, estreante na direção, mas autor do conhecido por aqui Wimbledon: O Jogo do Amor, reinveste no romance. Dessa vez de uma forma diferente, acompanhando os dias do menino Gabe, muito bem interpretado por Josh Hutcherson (de Zathura: Uma Aventura Espacial) e sua progressão de sentimentos, desde o já conhecido ‘ódio às meninas’ que todos os meninos tem quando crianças, até sua completa paixão por sua colega Rosemary (Charlie Ray, estreante meio perdida nesse papel).

O filme todo nos é apresentado exclusivamente sob a ótica de Gabe, que é o narrador dessa fábula engraçada, leve e cativante. Narrações, ainda mais feitas na voz de uma criança, muitas vezes tendem a comprometer toda a estrutura de um longa. Mas felizmente isso não acontece em ABC do Amor, que, além de tudo, é uma declaração de amor não só de Gabe a Rosemary, mas também dele (e do diretor) a Nova York.

Definitivamente o filme não existiria se não fosse a mágica proporcionada pelo cenário em que se passa. ABC do Amor é a cara de Nova York e não poderia se passar em outro lugar. O título original, Little Manhattan, se dá devido exatamente a isso: o fato do filme ser dependente da locação. A "pequena Manhattan" em questão é o conjunto de quarteirões que o menino Gabe é autorizado por sua mãe a percorrer em seu (incansável) patinete. Mas claro que, com o seu primeiro amor aflorando, esses limites serão transpostos. Não só o físico, mas vários psicológicos.

Isso é o mais interessante de tudo: vermos como a mente de Gabe vai imaginando os acontecimentos e, antes de tudo, evoluindo e amadurecendo por causa dos sentimentos e das situações pelas quais ele está passando. Não, ABC do Amor jamais funcionaria se colocássemos um casal com mais de 20 anos na tela. O filme é repleto com todos os clichês possíveis de filmes românticos e só funciona porque as crianças são os personagens principais. Todos os personagens adultos do filme são apagados, até mesmo Cynthia Nixon (a Miranda de Sex and the City), que interpreta a mãe de Gabe. Notar também a apagada presença de Talia Balsam (Jackie, mãe de Rosemary), filha do ator Martin Balsam (de clássicos como Psicose), que já foi casada também com George Clooney. 

Bem enxuto e bem agradável de se assistir, ABC do Amor pode ser mais do mesmo. Na verdade é bem mais do mesmo. Claro, se levarmos em consideração que Gabe parece mais um adulto filósofo do que um pré-adolescente, o filme não funcionará. O segredo é desligar a mente e se deixar levar por essa deliciosa comédia romântica... inusitada.

setembro 16, 2005

Impulsividade (2005)

 


Título original: Thumbsucker
Direção: Mike Mills
Sinopse: Justin Cobb (Lou Taylor Pucci) seria um adolescente comum se não fosse o fato de que nunca conseguiu parar de chupar o dedo. Aos 17 anos, após ter tentado de tudo para se livrar do vício, ele finalmente resolve o problema através da hipnose feita pelo seu dentista, que tem ambições a psicólogo. O verdadeiro problema, porém, está apenas começando. Justin continua compensando suas frustrações pela boca, consumindo todo e qualquer tipo de droga, de maconha a remédios antidepressivos. Filho de pais que nunca saíram da adolescência, ele vai ter de aprender a crescer sozinho, nem que seja à força.


Essa infrutífera tentativa de fazer uma análise psicológica aprofundada da mente de um adolescente com problemas, tanto psicológicos quanto familiares, só não se torna um desastre total devido a dois pontos: todo o longa é escorado na irretocável interpretação do personagem principal por Lou Taylor Pucci e também pela trilha sonora, boa demais para esse tipo de produção.

É o tipinho de filme ‘quero-ser-cult’, tipinho que faz sucesso em festivais (como de fato passou na 29ª Mostra Internacional de São Paulo), conta com um elenco invejável: Tilda Swinton (As Crônicas de Nárnia, Constantine) faz a mãe de Justin (Pucci). O pai, Vincent D’Onofrio (Ed Wood, A Cela). Conta ainda com as participações, em papéis pequenos, de Keanu Reeves (Matrix, Alguém Tem Que Ceder) e Vince Vaughn (Penetras Bons de Bico, Psicose). Esse último, ridículo, por sinal, como em quase todos os filmes que participou até hoje.

Permeado com algumas cenas bizarras de sonhos de Justin, vemos sua trajetória desde adolescente problema até atingir o clímax com o que ele queria, porém, de maneiras ‘artificiais’. Impulsividade ainda tenta ser moralista em ter um final daqueles ‘felizes’, porém politicamente corretos, o que não seria o mais adequado para a história um tanto quanto dramática demais do adolescente Justin.

Temos a impressão de que ‘já vimos esse filme antes’, e, de fato, vimos mesmo. Várias vezes. Nada de novo é apresentado aqui, somente a compulsão do garoto em chupar o dedo (!) sempre que se encontra em problemas. Mas para isso existe o dentista-esotérico (!) dele (Reeves), que o ajuda através de hipnose (!). Do nada Justin deixa de ser tímido e antissocial para um grande orador, logo depois desistindo de tudo de maneira repentina e inverossímil, se entregando às drogas.

Um roteiro muito primário é a causa da derrocada dessa produção que, em mãos certas ainda teria como soar um pouquinho mais real e interessante. O estreante Mike Mills, que assina roteiro e direção, erra no tom e insiste nos mesmos clichês de outros filmes de adolescentes-problema. Até mesmo porque um pouquinho de pé no chão não faz mal a ninguém. A não ser que você acredite que um quadro cafona de lobos sob o luar seja capaz de curar uma ‘impulsividade’. Mas, salve Lou Taylor Pucci que consegue levar com firmeza seu personagem e fazer dele a única coisa complexa em toda a história. E, com isso, prender a atenção do público.