Páginas

junho 29, 2005

Guerra dos Mundos (2005)

 


Título original: War of the Worlds
Direção: Steven Spielberg
Sinopse: Ray Ferrier é um estivador divorciado, afastado de seus filhos, que vivem com a mãe. Quando sua ex-esposa deixa as crianças para ele cuidar durante alguns dias, o planeta é atacado por alienígenas que surgem do chão conduzindo tripods e destruindo tudo que encontram pelo caminho. Ray tenta proteger os seus filhos e fugir para Boston para se juntar a sua ex-esposa. Durante o trajeto, enfrenta várias adversidades e ataques.


Infelizmente, A Guerra dos Mundos nunca foi um livro extremamente conhecido por todos. Por isso, essa nova adaptação do clássico de H.G. Wells não foi considerada uma ‘heresia’ pelo público em geral, já que o romance homônimo é de geral desconhecimento. É muito comum esse fato acontecer no mundo do cinema: pessoas fanáticas pelo livro que está adaptado na tela reclamando que o diretor (ou o roteirista) não respeitou as intenções originais do autor. Como exemplo, existem milhares de crianças repreendendo o diretor Chris Columbus e Alfonso Cuarón por terem ‘menosprezado’ pontos-chave dos livros da franquia Harry Potter em suas adaptações no cinema. Mas, como Wells nunca foi pop o suficiente para todos reconhecerem erros e omissões, bem como o filme original de 1953, o novo trabalho de Spielberg ficou sendo meio que um ‘tudo vale’ (para o público leigo, obviamente).

Apesar de a história se passar nos dias atuais, uma jogada óbvia de marketing, ainda mais após a última adaptação/remake de um romance de H.G. Wells, A Máquina do Tempo, de 2002, ter sido um fracasso (em parte por se passar no século XIX, como no livro), o novo Spielberg consegue ser fiel ao romance de 1898 o máximo que pode. Começando exatamente igual ao primeiro capítulo, com uma narração perfeita, tanto em termos de prazer auditivo como visual, já aí está explícita a forma que o filme irá tomar: não uma cópia do texto original ou do filme predecessor, mas o novo Guerra dos Mundos se utiliza dos melhores momentos dos dois para se fazer.

Apresenta uma fotografia interessante em termos de aspecto, apesar de ter as mesmas tomadas óbvias típicas de um Spielberg. Mas, é claro, isso deve ser relevado. É um filme comercial, que entretém muito bem. Obviamente que outra marca registrada de Spielberg está aqui: os efeitos visuais. Centenas de destruições, intempéries, enfim, tudo que é grandioso aparece. E não, não é um novo Independence Day, como andaram dizendo. Ao passo que o filme de 1996 é nada mais que um show de destruição (muito bem executado, por sinal), aqui tudo tem um propósito e está em seu devido lugar. No final das contas, eu classificaria Guerra dos Mundos como sendo tecnicamente perfeito. Especialmente o som e edição, espetaculares.

Steven Spielberg sempre tentou ser o mais pop possível em seus longas, e mais uma vez isso se repete, seja com a mera aparição de Bob Esponja na TV, ou mesmo ao escalar Tom Cruise para o papel principal. O astro de Missão Impossível e O Último Samurai está um pouco deslocado no papel de pai de família aqui, mas devo dizer que, com exceção de De Olhos Bem Fechados, esse é seu melhor papel, se superando até mesmo do que no aclamado drama Nascido em 4 de Julho. E devo mencionar que Dakota Fanning também tem uma boa interpretação, apesar de sua personagem causar uma irritação constante na audiência. Boa assim como foi a sua salvação da fita O Amigo Oculto, sendo até melhor que o veterano Robert De Niro.

Os diálogos foram bem escritos, apesar de bem óbvios, com doses corretas de suspense e humor intercaladas. Toda sensação de pânico em Guerra dos Mundos é realista, desde o início, com a paralisação dos carros, eletrônicos e relógios, e, principalmente, em evitar mostrar os extraterrestres o máximo de tempo possível (como feito em Sinais). Sem enrolar, o filme vai direto para a ação, ao contrário do filme original. Mas, mesmo fugindo da primeira concepção cinematográfica feita, em certos momentos o novo Guerra dos Mundos parece um dèja vu do primeiro longa, principalmente, à primeira vista, pelos cenários, onde até mesmo existe uma igreja muito similar à antiga.

Logo de cara, sentimos falta do longa não ser apresentado em Cinemascope (tela cheia), é particularmente estranho isso devido à proporção da produção (que chegou a ser cogitada como a mais cara da história do cinema). Mas outros fatores logo nos fazem esquecer disso. Mesmo que óbvios, os ângulos e efeitos visuais são excelentes, tais como a trilha de John Williams, aqui neste trabalho extremamente parecido com Bernard Herrmann (Psicose, Cidadão Kane, Taxi Driver), e que vem se superando a cada parceria com Spielberg.

junho 24, 2005

Batman Begins (2005)

 


Título original: Batman Begins
Direção: Christopher Nolan
Sinopse: Marcado pelo assassinato de seus pais quando ainda era criança, o milionário Bruce Wayne (Christian Bale) decide viajar pelo mundo em busca de encontrar meios que lhe permitam combater a injustiça e provocar medo em seus adversários. Após retornar a Gotham City, sua cidade-natal, ele idealiza seu alter-ego: Batman, um justiceiro mascarado que usa força, inteligência e um arsenal tecnológico para combater o crime.


Apesar de alguns (poucos) méritos, Batman Begins é tão chato, superficial, hollywoodiano demais (até mesmo para os padrões de Hollywood, se é que isso é possível), e, muitas vezes, confuso e mal-pensado. Afirmo tudo isso aí categoricamente, sim, e não estou procurando ter razão ou não, e muito menos agradar a 95% das pessoas, público e crítica, que aplaudiram esse filme de pé. Não mesmo. Preciso dizer a verdade: nunca fui com a cara de filmes baseados em quadrinhos, e muito menos algum dia fui com a cara do Batman, que já estrelou filmes dignos de notas zero bem redondas, como Batman Eternamente e Batman & Robin.

O trailer vendia um longa que parecia trazer um "clima" diferente do já apresentado até então à história, mas o que vemos é um dèja vu constante. Resumindo, Batman Begins é chatíssimo e só agrada aos fãs do personagem.

Algo que chama a atenção no longa é a presença de excelentes atores em papéis mínimos que não representam nada no desenvolvimento da história, como Michael Caine no papel do patético-cansado-fiel mordomo dos Wayne e ainda Morgan Freeman, que é nada mais do que o personagem "Q" dos filmes de 007. Freeman interpreta Fox, que aparece por uns dez minutos de todos os infindáveis 141 totais de filme. Ele nada mais faz do que mostrar a Bruce Wayne (Christian Bale, muito inferior do que em trabalhos anteriores, como, por exemplo, Psicopata Americano), os incríveis aparatos tecnológicos que irão transformá-lo no Homem-Morcego.

O que irrita de verdade em Batman Begins é com certeza a obviedade e a previsibilidade exageradas do roteiro. Há uma história boa, um roteiro que parecia, a princípio, levar a algum lugar, mas que acaba se tornando simples, muito simples, com falas extremamente idiotas durante todo o longa. Parece um filme de criança, mesmo: até mesmo na hora de um grande incêndio, lá vem o mordomo com uma tirada que foi escrita supostamente pra ser engraçada, e, quando essa e mais outras tiradas "cômicas" são postas na tela, acabam soando como frases ditas em filmes de Leslie Nielsen. Talvez para esse Batman Begins ele devesse até mesmo ser o protagonista mascarado.       

É triste ver excelentes atores, como os já mencionados Christian Bale, Morgan Freeman, Michael Caine e, principalmente, Liam Neeson, completamente desperdiçados nesse monte de bobagens e banalidades (nem digo clichês porque isso seria pouco) que é a composição geral dessa nova aventura de Batman. O filme foi feito exclusivamente para aquele grupo de pessoas que consideram Jean-Claude Van Damme um artista. Aliás, existem cenas repletas de fogo e explosões nas quais só faltamos ver o próprio Van Damme pulando e escapando das situações.

É de se admirar que o diretor Christopher Nolan tenha tomado a direção e tenha uma co-participação na escrita desse roteiro, que parece feito aos moldes do livro A Jornada do Herói, de Vogler. Há um mentor óbvio (Neeson), ou melhor, dois mentores, um físico, Neeson, e um psicológico, Caine. Como "o roteiro perfeito" descrito por Vogler em seu livro, o herói sofre horrores pra ter a verdadeira vontade de se tornar herói, e o pior é que o Batman daqui é um herói sem carisma algum e parece mais querer se vingar das pessoas do que ter a "vocação" para o heroísmo, ele não tem o "dom" de salvar o mundo, só o faz por causa de seus próprios problemas, num verdadeiro show de egocentrismo.

Nada mais do que um dramalhão que causa inveja às piores  novelas mexicanas do SBT, com certas cenas que causam medo de se ver, não pelo medo em si, e sim pelo ridículo que vemos. Só pra citar um exemplo, quando aparecem os lutadores ninja (com o excelente, porém perdido Liam Neeson), é tudo simplesmente deplorável, cena digna de entrar para um top 10 dos momentos mais idiotas da história do cinema.

O roteiro ainda tenta, sem sucesso, se utilizar de um plot twist, apresentando uma revelação sobre a verdadeira identidade do vilão, e isso não faz o filme se tornar mais interessante. Com certeza o pior de tudo é a longa espera, nada acontece por muito tempo. Quando já estamos quase dormindo de tédio, somente aí vemos Bruce Wayne vestido como Batman, muito mais de uma hora decorrida do início. E esse mesmo início é o único ponto alto do filme, principalmente pela edição, ágil e instigante, e, talvez também seja interessante a trilha sonora composta por James Newton Howard (da excelente trilha de O Sexto Sentido), mas que, mesmo assim, fica muito aquém dos outros trabalhos do compositor.

Pra piorar, ainda é deixado um gancho para uma possível continuação. Uma idéia simplesmente pavorosa. Talvez até poderia haver uma seqüência, sim, que nos mostrasse a derradeira aventura do Homem-Morcego e sua conseqüente morte. Assim, o mundo estaria livre de testemunhar esses pavorosos filmes da franquia Batman. Quem sabe alguém não se aventura a escrever um roteiro para essa idéia... talvez, dessa vez, Batman Ends?

junho 15, 2005

A Casa de Cera (2005)


Título original: House of Wax
Direção: Jaume Collet-Serra
Sinopse: Um grupo de amigos da faculdade está a caminho de um jogo de futebol quando, em uma cidade fantasma, o carro quebra e são obrigados a procurar auxílio no único lugar que está aberto: o museu de cera local. Eles ficam impressionados com a perfeição das esculturas e logo percebem a razão de tanto realismo. Aterrorizados, fogem para não se transformarem em peças de museu.


É até ousado (ou seria "bobo"?), é um remake de um "clássico" do terror norte-americano dos anos 50, foi reescrito para se tornar um thriller adolescente pós A Bruxa de Blair. Não estou tentando fazer comparações com o referido filme de 1999 (A Bruxa de Blair), e nem o tomando como parâmetro, uma vez que desprezo esse filme – e que isso fique bem claro. Bem, sabendo-se de tudo isso aí sobre A Casa de Cera, o que se poderia concluir é que esse filme também foi feito para ser desprezado. Mas não. Ele tem tudo pra dar errado, mas não dá. Na verdade, o que acontece é o contrário. Ele dá certo.

Sem levar em consideração as centenas de clichês e obviedades que o filme apresenta (sim, a música de abertura que toca nos créditos iniciais é um hard rock característico de filmes de terror "adolescentes" atuais), A Casa de Cera tem muitas qualidades. O prólogo é interessante, com o ataque físico-psicológico de um dos irmãos – que descobrimos depois serem gêmeos siameses separados – chamados Bo e Vincent, quando crianças. A mãe amarra Bo em sua cadeira, numa cena um tanto quanto "forte", logo de cara. Serve pra preparar o espectador para o que vem pela frente. O longa tem classificação 18 anos e não é pra menos. Se você tem o estômago fraco, não assista. A Casa de Cera faz por merecer a classificação etária que lhe foi concedida.

Já no mesmo prólogo, além desse tom pesado que sabemos que o filme irá tomar, somos induzidos na atmosfera de A Casa de Cera: uma fotografia verde-azulada constante (cores essas que compõem o pôster do filme, inclusive), que passa a sensação de tristeza e solidão necessárias para nos transportarmos a Ambrose, uma minúscula cidade, misteriosamente vazia...

Logo que "entramos" de fato no filme, o que se vê na tela não é grande coisa. Pode-se até dizer que o primeiro ato do filme é sem sentido, meio que querendo copiar de tudo um pouco do que já foi feito de terror nos últimos anos... grupo de adolescentes com todos os estereótipos presentes lá, carros que se desviam da estrada principal e pegam um desvio que os levará até o perigo, e até a menina que sai sozinha no meio da noite em um acampamento porque escutou "algo". O filme ainda se utiliza de mais recursos de A Bruxa de Blair, principalmente ao mostrar ao espectador fatos através de uma câmera digital que um dos personagens carrega. Mas, felizmente, esse recurso é logo abandonado.

O filme carece de uma ‘unidade’. Certo, deve-se levar em consideração que esse é o primeiro longa do diretor espanhol Jaume Collet-Serra, e que ele acerta em muita coisa, mas, sinceramente, parece que o primeiro ato foi dirigido por outra pessoa. Quanto ao elenco: a grande espera (ao menos ao meu ver) era ver como Paris Hilton iria ‘aparecer’. E foi como o previsto. Realmente algo estranho acontece com ela. Hilton não tem nenhuma expressão facial, é como se ela tivesse acabado de aplicar botox e estivesse na fase de não poder mexer os músculos do rosto (quem viu A Nova Cinderela vai entender do que estou falando), além de parecer um travesti, com uma voz tão grossa às vezes que dá até pra achar que ela é o irmão maléfico escondido de Bo, Vincent Sinclair. E Chad Michael Murray está bem no papel do bad boy, pelo menos diferindo um pouco do pouco que ele fez até hoje, mas também, nada além disso, somente está bem e ponto.

Quando somos apresentados à cidade de Ambrose, só a mera existência dela causa arrepios. Ninguém na cidade, um posto de gasolina abandonado, algumas casas, uma igreja (onde estão ‘todos’ da cidade, em um velório), e... o museu de cera. Os bonecos de cera e tudo mais dentro do desolado museu já apavoram, sem nenhum motivo aparente, mas apavoram. E, com certeza, o público se choca ainda mais quando descobre como esses bonecos são feitos... e quando se descobre como são todas os habitantes de Ambrose.

A partir daí o filme se torna uma corrida de gato e rato, dos irmãos assassinos atrás do grupo de adolescentes, que, obviamente, são apanhados um a um. Algumas cenas se destacam nessa corrida, que pode parecer óbvia e sem graça a princípio. E é, mas consegue prender a atenção do espectador até o fim. Quando Bo persegue Carly no velório, descobrimos que os gêmeos são mais dois Norman Bates duplicados do que qualquer outra coisa. A mãe deles está lá, imortalizada em cera no caixão, e toda a cidade fora feita em sua homenagem. Uma ideia doente que eles planejam levar até as últimas consequências. E o modo que as estátuas de cera são feitas é simplesmente escabroso. Aliás, o filme inteiro é explícito ao máximo, com dedos (e cabeças) sendo decepados com alicates e facas, pessoas que têm a boca colada com cola Super Bonder etc. É explícito demais, mas a proposta era exatamente essa, e funciona bem.

O ponto alto de todo o longa é, com certeza, a perseguição dentro da sala de cinema. O antigo cinema da cidade está passando O Que Terá Acontecido a Baby Jane?, um clássico do suspense, de 1962. O filme antigo, que é sinistro em sua própria maneira, fica ainda mais aqui. Ninguém gostaria de estar na pele da protagonista (Elisha Cuthbert, muito melhor do que em seu trabalho anterior, Show de Vizinha): um cinema escuro com um assassino te perseguindo, o boneco de cera pavoroso ao seu lado é na verdade uma pessoa que foi morta pelo mesmo homem que está te perseguindo e Bette Davis, como a pavorosa Baby Jane do filme,  cantando "I’ve Written a Letter to Daddy" na tela... convenhamos, não é nada agradável.

A Casa de Cera é um dos raros exemplos de filmes que começam muito mal, mas muito mal mesmo, e vão melhorando a cada minuto que passa, culminando em um interessante, inteligente terceiro ato, com cenas como a já mencionada acima e com um grand finale a la Hitchcock, que é o derretimento da casa de cera, e a morte (irônica, pela posição em que morrem – quem viu o filme entenderá) da dupla de vilões. Para completar o final, há uma ‘revelação’, nem um pouco genial, mas que não deixa de ser interessante, ao menos.

É diversão enlatada, só isso. Produzido pela Dark Castle, de Robert Zemeckis (a mesma que produziu o péssimo Na Companhia do Medo), A Casa de Cera agrada, tem uma composição interessante em quase todos os 113 minutos de projeção. Mesmo se aproveitando de uma idéia anterior (mas bem modificada), ela ainda soa original. E perdi a vontade de revisitar o Museu de Cera de Madame Tussaud. Quem sabe em outra oportunidade...

junho 11, 2005

A Terra Encantada de Gaya (2004)

 


Título original: Zurüch nach Gaya
Direção: Holger Tappe, Lenard Fritz Krawinkel
Sinopse: A Terra Encantada de Gaya é um programa de TV passado em um mundo fantástico, repleto de paisagens paradisíacas, cores e os mais variados seres. Nele vivem o corajoso Zino (Márcio Garcia), o trabalhador Boo (Wellington Muniz) e Alanta (Sabrina Sato), a linda filha do prefeito, além dos terríveis Snurks: Galger (Marcos Chielsa), Zeck (Rodrigo Scarpa) e Bramph (Carlos Alberto). Quando a pedra mágica, o elixir da vida de Gaya, desaparece, os Gayanos entram em atrito com os Snurks. Repentinamente eles são arrancados de seu mundo para outra dimensão, na qual precisam se unir para sobreviver.


Esse longa nos traz duas novidades: uma boa e outra péssima. A boa é que se trata de uma produção computadorizada europeia, e isso acaba por nos dar uma ideia do que anda sendo feito em termos de animação por aqueles lados. É o primeiro longa completamente digital da Alemanha. Vale lembrar que o Brasil foi o pioneiro em termos de animação digital, tendo sua produção começado antes mesmo do aclamado Toy Story da Disney/Pixar. O pioneirismo da animação digital no mundo foi com Cassiopeia: O Filme, recentemente lançado em DVD, uma animação muito simpática.

A má notícia que A Terra Encantada de Gaya nos traz diz respeito também, infelizmente ao ‘dedo’ brasileiro nele. Mais uma vez emerge o quesito dublagem. O Brasil é altamente reconhecido por suas dublagens profissionais e realistas. Veja bem, eu disse PROFISSIONAIS. Essa animação foi dublada pelas pessoas que apresentam o programa Pânico na TV, ou seja, nem preciso explicar mais nada. Algumas vozes estão até aceitáveis, mas em sua maioria, os diálogos não estão sincronizados com a boca dos personagens ou até mesmo as vozes soam ridículas. Obviamente estou falando do caso da Sabrina Sato, um ser que não tem capacidade nem para somar dois mais dois, isso já sendo mostrado na TV e aqui, infelizmente, estraga a personagem Alanta.

A história é bem inverossímil e agrada bastante às crianças menores. Não é um longa que serve para adultos, como Madagascar e Os Incríveis foram nos últimos tempos. Gaya é um programa de TV e seus personagens se veem em problemas quando são raptados junto com sua ‘fonte de energia’ – uma pedra brilhante – por um ex-apresentador de televisão e cientista que se tornou obcecado por audiência e, quem sabe, controlar o mundo (ou destruir, sei lá eu – como a maioria dos vilões de animações).

À parte da história, a animação em si deixa bastante a desejar, principalmente se formos considerar a movimentação dos personagens e suas expressões (corporais e faciais). Mostra um desenvolvimento de CGI ainda muito primitivo, inferior até mesmo aos feitos há mais de dez anos pela Pixar, com o mesmo Toy Story, no qual os personagens eram completamente "independentes". Aqui, se parecem um pouco com marionetes. 

Os clichês estão todos presentes, mas isso certamente não incomoda aos pequenos. Mas irrita um pouquinho os "mais crescidos", como eu. Com um primeiro e segundo atos extremamente arrastados, a ação se concentra quase que em sua totalidade na parte final – inclusive foi a única parte em que todas as crianças na sala onde eu estava se calaram e se concentraram no filme. Talvez funcione melhor em uma outra oportunidade, quando se puder assistir em DVD com legendas, sem ser atrapalhado pelos pavorosos "erres" caipiras de Sabrina Sato e falta de motivação dos demais dubladores.

junho 10, 2005

A Família da Noiva (2005)

 


Título original: Guess Who
Direção: Kevin Rodney Sullivan
Sinopse: Percy Jones é um pai amoroso, porém rígido, que tem uma grande surpresa ao conhecer seu futuro genro. Percy e sua família são negros e Simon, o noivo de sua filha, é branco. Tudo se complica quando Simon se mostra bastante atrapalhado perto do seu sisudo futuro sogro.


Passou do prazo de validade. Infelizmente foi isso que aconteceu com a proposta apresentada pelo longa A Família da Noiva, uma versão travestida do excelente Adivinhe Quem Vem Para Jantar, de 1967, que trazia Sidney Poitier, igualmente excelente, junto com Katharine Hepburn. Essa proposta aí mencionada era pra ser a mesma do original dos anos 60, porém invertida. Explico: em Adivinhe Quem Vem Para Jantar, Poitier é o namorado (naquela época, noivo) de uma moça branca (para quem não sabe, Poitier é negro), que vai passar um final de semana com os pais dela, que, por sua vez, não o conhecem. Eles então ficam perplexos pela filha deles estar noiva de um negro. E o que é apresentado nessa nova versão é a mesma coisa, sendo que dessa vez toda a família é negra e o noivo (agora, namorado), branco.

O namorado branco é interpretado por Ashton Kutcher, que tem se mostrado um bom ator, não só em comédias totalmente impensadas como essa, mas também em filmes de outros gêneros (vide o excelente Efeito Borboleta). Neste cansativo A Família da Noiva, Kutcher nada pode fazer para desenvolver um personagem fraco, sem força de vontade, que é empurrado de uma cena para outra em direção a lugar nenhum. O personagem Simon (Kutcher) é praticamente o único ator branco do elenco, e isso funciona muito bem para mostrar o "isolamento" que ele está sentindo nos acontecimentos mostrados. Mas não é só o personagem que está isolado. Kutcher também está. A performance dele é a única que não é totalmente caricata, das várias apresentadas pelo resto do elenco.

O filme já começa de uma forma tão óbvia que causa medo ao espectador, logo de cara, pelo que o espera pela próxima hora e meia que será aterrorizado por infindáveis piadas sem graça (como toda a cena da mesa de jantar, em que são contadas inúmeras piadas raciais preconceituosas, e também os numerosos casos e de piadas de cunho homossexual depreciativas que insistem em aparecer por todo o longa). Simon esconde coisas de sua namorada quando ele é pego de surpresa: ele pediu demissão e logo depois descobre que a coisa que seu sogro mais preza é o trabalho. Ele subtrai essa informação então, para a felicidade de todos... do sogro, que vai ficar feliz, de sua namorada, que vai ficar feliz porque seu pai vai ficar feliz e pra dele mesmo, que vai ficar feliz porque os outros dois estão felizes. Complicado, não? Não mesmo. No final das contas, o único que não fica feliz é o espectador, que tem sua inteligência subestimada com cenas tão previsíveis como essa já mencionada e dezenas de outras mais. Só para citar mais um exemplo, quando o casal está no táxi, e o motorista, negro, é insistentemente focalizado, qualquer um com um mínimo de discernimento deduzirá que algo irá acontecer. E realmente acontece. O sogrão acha que o taxista é o namorado da filha e que Simon é o taxista, já que ele se presta a carregar todas as malas para fora do carro (?!).

E por falar no personagem do sogro, ele é terrivelmente interpretado por um Bernie Mac extremamente maquinal, robótico, mergulhando a fundo no estereótipo de ‘pai da noiva’. Resultado de um roteiro mal escrito, por falas óbvias que chegam a doer nos ouvidos, e de uma direção mal executada (o diretor é o mesmo de Barbershop 2), em que até gestos e olhares dos personagens são clichês intermináveis. O personagem de Mac é extremamente neurótico, chegando a irritar antes mesmo da metade do filme. Simon nunca dá motivos para que ele desconfie tanto dele (sabe-se lá de que, isso nunca é dito, ele só "não gosta"). O único problema dele seria ser branco, mas o roteiro apresenta uma fuga fenomenal do argumento inicial. Na maior parte do tempo, a questão racial nem é mencionada.

O filme chega a extremos do absurdo e do ridículo, atingindo o clímax na cena em que o sogro desafia Simon em uma corrida de kart, em uma sequência que não possui qualquer ligação direta com o resto das cenas anteriores ou posteriores. O personagem de Mac causa uma antipatia tão grande no público (e, muito provavelmente, em Simon também), que nos perguntamos porque Simon ainda insiste em ficar na mesma casa que o paranoico "pai da noiva", que chega ao ponto de dormir com ele na mesma cama todas as noites para ‘salvaguardar’ sua filha.

A Família da Noiva não é um zero total talvez somente por uma única cena, que funciona perdida como uma Atlântida de erros crassos e piadas entediantes: no carro, indo para o hotel, é o único momento do longa em que Bernie Mac e Ashton Kutcher se entrosam, enquanto escutam no rádio músicas sobre desigualdade racial, por acaso. Momento esse que culmina em "Ebony and Ivory", de Paul McCartney e Stevie Wonder, que, dadas as circunstâncias, acaba de tornando engraçadíssima. Depois disso, mais alguns bons momentos de Kutcher e só. Por aí acabam as qualidades, mesmo.

Depois de mais de uma hora e vinte minutos de projeção e vinte e cinco olhadas no relógio pra ver se a tortura está prestes a acabar, ainda não dá pra se ver uma conclusão viável à história. Aliás, esse filme poderia até se transformar em novela, já que usa e abusa da "técnica enrolativa", não necessitando de um final crível e rápido. De repente, então, o sogrão fica bonzinho e passa a achar Simon perfeito para sua filha, depois deste o ensinar a dançar (sim, o desrespeito à capacidade intelectual do espectador é assustador).

Um fato curioso é que esse terrível A Família da Noiva tenta copiar descaradamente os exageros de Entrando Numa Fria (Meet the Parents, EUA, 2000). A diferença é que no segundo, tudo funciona, e no primeiro, não. Simples assim. Bernie Mac não consegue ser vilão e engraçado ao mesmo tempo, como Robert De Niro foi em Entrando Numa Fria, nem Ashton Kutcher consegue ser atrapalhado o suficiente como Ben Stiller no mesmo filme. Escalação de elenco errada, o longa sofre com um tenebroso problema de timing, com cenas que parecem se prolongar por toda a eternidade.

E, como a cereja no topo do bolo, somos "presenteados" com um número musical deprimente no final, e, o pior de tudo, cenas durante os créditos finais. Sim, e ainda por cima, com vozes em off. Tinha que ser com vozes em off pra colocar a moldura nesse desastre que é A Família da Noiva. Sinceramente, pra completar o ridículo mesmo, só faltavam as aparições de Didi Mocó e Dedé Santana.

Ao invés de perder seu tempo com esse filme, vá passar o dia com sua sogra. A experiência deverá ser tão "maravilhosa" quanto ver isso aqui... esse amontoado de bobagens que algum dia alguém ousou chamar de filme.

junho 09, 2005

Sr. e Sra. Smith (2005)

 


Título original: Mr. & Mrs. Smith
Direção: Doug Liman
Sinopse: John e Jane Smith aparentemente parecem formar um casal normal, mas na realidade ambos mantêm um segredo. Os dois são assassinos de aluguel contratados por empresas rivais. A verdade só vem à tona quando John e Jane, sem saber, recebem uma missão para eliminar o mesmo alvo e mais tarde descobrem que devem matar um ao outro.


Provavelmente esse Sr. e Sra. Smith irá vingar e fazer relativo sucesso em sua carreira nas salas de cinema ao redor do mundo. O filme une ação e comédia na dose certa em quase todo o tempo de projeção.

A maioria dos que comentam sobre esse filme são fãs dos atores principais, o badalado (porém, já superexposto) Brad Pitt e Angelina Jolie, considerada por muitos a mulher mais bonita da indústria do cinema. O curioso da maioria desses comentários que li é que eles aplaudem cegamente a ‘interpretação’ dos dois referidos atores, nos personagens que dão o título ao filme, John Smith e Jane Smith. Agora, precisamos separar uma coisa da outra – atuação e beleza. E isso tem se confundido muito ultimamente. O fato é que Pitt tem uma atuação forçada durante todas as cenas em que aparece (ou seja, quase o filme todo), e tenta, de qualquer modo, ser engraçado, mas sem sucesso. Em contrapartida, parece que Jolie achou o papel certo para ela. A personagem Jane Smith está engraçada nos momentos certos, e também cínica quando deve ser. Talvez essa personagem seja a que a filha do veterano ator Jon Voight mais apareceu como atriz e menos como ‘a estrela, famosa e gostosa’, como ela nos é apresentada desde o deplorável Lara Croft: Tomb Raider. Viram? Tomb Raider também é um filme de ação, mas em Sr. e Sra. Smith, Angelina consegue demonstrar que tem mais do que beleza exterior, mas conteúdo. Ao contrário de Pitt, que nunca mais acrescentou nada ao cinema depois de sua interpretação extraordinária (e talvez, única) em Clube da Luta. Aliás, filme esse que é lembrado em algumas cenas aqui, mais descaradamente quando o personagem Benjamin chega a usar uma camiseta do filme.

Esse problema dos protagonistas poderia facilmente ter comprometido todo o longa, mas felizmente isso não acontece. A química entre os dois não existe, e o filme é completamente centrado nos mesmos dois, praticamente desprovido de coadjuvantes. Mas, como já disse, outros fatores salvam Sr. e Sra. Smith do fracasso. A fotografia chama a atenção por nunca ser demasiadamente cheia de cores, talvez pelo fato de Bojan Bazelli, o fotógrafo, levar um jeito para filmagens pseudo-monocromáticas (o tão falado O Chamado também teve sua fotografia assinada por ele). A trilha original do filme é igualmente interessante, composta por John Powell (compositor de outros sucessos recentes como Robôs e Be Cool: O Outro Lado do Jogo, mas principalmente das excelentes trilhas de A Identidade Bourne e A Supremacia Bourne).

Sr. e Sra. Smith tem uma proposta interessante, desenvolvida em um roteiro igualmente interessante (mas não genial), com alguns furos, mas poucos. Algumas coisas são meio que inexplicáveis na história, como o fato de existirem pelo menos três agências de espionagem rivais, duas delas pras quais os Smiths são contratados para se matarem. Para quem vai ao cinema sem saber do que se trata o filme, o 1° ato é meio confuso, parece que o longa será mais algo voltado para a ação mesmo, quando na verdade o forte é a comédia, mostrada num 2º ato brilhante, iniciado logo após Jane Smith descobrir que seu marido é o maior inimigo dela nos ‘negócios’. Nesse 2º ato é que vemos o desenrolar ‘cômico’ da história, com cenas impecavelmente produzidas, como a da luta dos dois dentro de casa – comparável à luta da Noiva com Elle Driver em Kill Bill: Volume 2, só que em escala muito maior.

Nesse meio tempo é que vemos mais do personagem Eddie, interpretado por Vince Vaughn, que não ajuda em nada na evolução dos acontecimentos e que parece recém-saído do Bates Motel. Ver a atuação de Vaughn aqui é como ter um déjà vu do péssimo desempenho dele como Norman Bates em Psicose (remake do clássico de Hitchcock). O déjà vu ainda se confirma quando ele fala em como “só confia em sua mãe”, e mais ainda porque essa mãe dele nunca está em cena durante todo o longa, só ouvimos sua voz. Coincidências demais? Talvez.

É difícil um filme de espionagem não ter as conhecidas ‘geringonças’ tecnológicas e artefatos capazes de fazer qualquer coisa que se queira. E, é claro, tudo isso está presente aqui, mas é preciso dizer que isso até cansa o espectador em certos momentos, ver como tudo se resolve com o apertar de um botão (ou de um gatilho!) e de repente a personagem está ‘voando’ por um cabo, de um prédio para outro, a dezenas de metros de altura na movimentada Manhattan.

Infelizmente o longa se perde um pouco no 3º ato, exageradamente longo e sem propósito. São intermináveis cenas dos dois (agora aliados) fugindo de seus assassinos e ex-colegas de profissão. Mas mais uma vez, isso não é o suficiente para estragar a sensação final que se tem ao assistir Sr. e Sra. Smith. Definitivamente o filme se faz em pequenos momentos e pequenos diálogos. Só pra citar um desses momentos, a cena em que eles estão na loja de móveis tentando escapar da morte, e conversam num elevador ao som de ‘Garota de Ipanema’ é fantástica.

No final das contas, eles são dois agentes 007 um pouco mais irritados do que o normal. E tudo funciona muito bem na cabeça de quem está vendo, uma vez que o filme mostra nada mais do que uma briga de casal (mesmo que seja em níveis estratosféricos). Apesar de tudo o que foi mencionado, o conjunto da obra é positivo e serve à sua necessidade básica, que é entreter sem grandes compromissos. E, diga-se de passagem, serve muito bem a essa necessidade.

junho 02, 2005

A Pessoa É Para o Que Nasce (2003)

 


Título original: A Pessoa É Para o Que Nasce
Direção: Roberto Berliner, Ricardo Domingues
Sinopse: A história de três irmãs cegas que viveram cantando e tocando ganzá em troca de esmolas nas cidades e feiras do Nordeste do Brasil.


É uma pena que não exista no Brasil (nem no mundo em geral, mas por aqui é pior), a aceitação do documentário como uma forma de cinema "comum", que também serve para entretenimento. Já passou a época em que os documentários eram meros vídeos da National Geographic Society mofando na prateleira, com entrevistas intermináveis sobre animais desconhecidos. A forma do documentário atual é bem diferente, praticamente como uma "extensão" dos filmes ficcionais, tratando de temas presentes em nosso cotidiano, e mesmo assim, fantásticos em seu modo particular de ser.

E o que poucos sabem, por puro preconceito (ou "pré-conceito"), é que maravilhosos filmes como Justiça, do ano passado, acabam sendo deixados em segundo plano. E o mesmo trágico destino aguarda pelo não-menos-admirável documentário brasileiro A Pessoa É Para o Que Nasce.

O Brasil vêm se consolidando (ou pelo menos tentando se consolidar) como um dos melhores realizadores de documentários do mundo. Mas, infelizmente... pouquíssimo público, isso não tem jeito. Nem "filmes-documentários-blockbusters", como o polêmico Fahrenheit 11 de Setembro, obtiveram o mesmo desempenho de público observado em outros países. 

Apresentado na recentemente desenvolvida forma digital, que começa a se popularizar em alguns circuitos de cinemas do país (em sua maior parte os "culturais"), o filme chama logo a atenção por apresentar legendas, mesmo que todas as pessoas nele estejam dialogando em português. A única explicação lógica para isso (creio que a utilização de legendas não foi para os deficientes auditivos), a meu ver, é a de que, em certas partes da projeção, realmente torna-se difícil para o cidadão do sudeste ou sul do Brasil entender coisas ditas com o forte sotaque nordestino de Campina Grande, Paraíba, onde o filme é concentrado na maior parte do tempo.

Mesmo tratando-se de um documentário sobre três irmãs cegas que vivem de pedir esmolas enquanto tocam e cantam canções (de composição própria) em seus ganzás (instrumento de percussão do Nordeste), não se esperava que o filme apresentasse uma composição sonora tão cuidadosa. Seja pela curiosa forma de ‘musicalização’ das falas das protagonistas, quando elas se apresentam para o espectador, seja pela forma em que as canções delas nos são apresentadas, como "Sereno da Madrugada", que ficam na cabeça do público, este querendo ou não, ou mesmo pela trilha original do filme: simples, porém, serve ao seu propósito.

Na parte técnica o filme é impecável, com uma edição ágil com vários inserts de TV entre as cenas. Porém, apresenta um ponto fraco: nas cenas mais dramáticas, o diretor, Roberto Berliner, não se preocupou muito em deixar a emoção se desenvolver, preferindo seguir mais pelo caminho da comédia até a "redenção" final das irmãs. Funciona, e com boa resposta do público, que pareceu se divertir bastante (assim como eu) com os inúmeros diálogos cômicos do filme. Vale lembrar que a falta de edição é um ponto alto em certa parte, logo após a cena em que uma das irmãs se declara apaixonada pelo realizador do longa, o mesmo diretor Berliner. A cena seguinte é constituída de um único plano longo, em que elas, num quarto de hotel, sozinhas, escutam à música "À Distância", de Roberto Carlos, que dá o tom dramático e de desilusão corretos ao momento. 

Apesar de se tratar de uma história dramática, com um final igualmente dramático, porém com algumas vitórias, saímos da sala de cinema com um sorriso no rosto, pois o documentário nos passa a sensação de que mesmo com inúmeras adversidades, as três irmãs cegas tiveram um final "feliz", pelo menos nas cabeças delas. Chama a atenção o comentário de uma delas de que o cinema é, além de tudo, uma forma de esquecer a realidade, mesmo que a estejamos encarando de frente, como feito nesse filme.

Para finalizar com o tom de bom humor presente ao longo dos 80 minutos de projeção, as irmãs recomendam ao público que escute as músicas delas, regravadas por cantores famosos no Brasil, e que comprem o CD do longa. E funciona. O público ficou na sala até o final dos créditos. Eu quero o CD das irmãs ceguinhas de Campina Grande... mas, infelizmente, para encontrá-lo, talvez seja necessária uma maratona tão grande quanto achar uma sala de cinema no país que esteja com A Pessoa É Para o Que Nasce em cartaz. Uma pena.

Sahara (2005)

 


Título original: Sahara
Direção: Breck Eisner
Sinopse: Após encontrar uma moeda mitológica, o explorador Dirk Pitt (Matthew McConaughey) parte em uma caça ao tesouro em uma das regiões mais perigosas do oeste africano. Dirk está em busca do que os nativos chamam de "navio da morte", um navio de batalha da época da Guerra Civil que está perdido há séculos e que pode ter carregado consigo uma carga secreta. Dirk recebe a ajuda de Al Giordino (Steve Zahn), seu parceiro de expedições. A dupla conhece a bela Dra. Eva Rojas (Penélope Cruz), uma pesquisadora que acredita que o navio possa estar ligado a um problema bem maior. Juntos eles tentam desvendar o mistério e encontrar o navio perdido.


É até difícil falar algo sobre um filme tão malfeito como Sahara. A produção não convence o espectador sério de jeito nenhum. Certo, é um ‘filme-pipoca’, mas se pelo menos ele servisse ao seu propósito básico de entreter... e isso definitivamente não acontece por aqui.    

Sahara começa até bem, com uma batalha de um encouraçado em um rio. Uma batalha noturna, bem executada, e com uma das únicas e poucas qualidades do filme presentes nela, que é a mixagem de som, mas que assim mesmo, não é nada para se ficar impressionado.

Mas Sahara desanda completamente depois dessa primeira sequência. Aliás, o resto do filme faz até essas cenas iniciais se transformarem em um gigantesco clichê. Aquela batalha serve para nada mais do que contar uma historinha que se passou, e que pouco ajudará no desenvolvimento do filme. Mas, afinal, qual é a história de Sahara? Boa pergunta.

A palavra mais educada e carinhosa com a qual posso definir esse roteiro é ‘estúpido’. Na primeira meia hora de projeção, o que parece é que iremos ver um remake de Anaconda sem as cobras, e, no lugar delas, imensos e ‘maus’ africanos que defendem seu país (e seu ditador). Sim, e estão presentes lá todos os sofríveis estereótipos de personagens concebidos em roteiros de filmes de aventura... um personagem retardado que atrapalha os outros na jornada, um bonitão que no final sempre termina com a gostosa do filme (era J.Lo em Anaconda, aqui somente substituída por uma Penélope Cruz desajeitada e que nunca acha o tom da personagem), um coadjuvante que salva todos da destruição, e, é claro... nada melhor do que nativos vilões.

É incrível como os nativos nigerianos são tratados no filme. Parece que o cargo de figurinista passou longe das planilhas de produção de Sahara. Ou até mesmo, quem sabe, o cargo de diretor é o que tenha ficado sem preencher. Breck Eisner faz turbantes aparecerem magicamente no meio do deserto, ou até mesmo um bar (!) com logotipo da Coca-Cola e tudo... será uma miragem? O figurinista, se é que há algum, decide transformar os nigerianos que estão  no museu, ouvindo a apresentação de um almirante da NUMA (William H. Macy, completamente sem poder adicionar nada, em uma participação ínfima), em pessoas que estão prestes a desfilar no sambódromo. E além de tudo mais, é claro, há os americanos que fazem cara feia para as ‘exóticas’ comidas da festa, como de praxe.

Enfim, história completamente previsível, roteiro com furos (na verdade, rombos), como quando os personagens colocam pra funcionar um avião despedaçado (no maior estilo O Vôo da Fênix, mas aqui eles acham o avião no meio do deserto, por mágica!), e usam-no como um barco à vela com rodas, e, como era de se esperar, coisas que nos fazem pensar: “eu não estou vendo isso!” – um canhão que passou 120 anos enterrado nas areias do Saara funciona perfeitamente (e derruba helicópteros).

Tudo isso fora uma Penélope Cruz que leva a nocaute vários africanos com o dobro do tamanho dela com a maior facilidade, e o personagem de Steve Zahn com uma linha irritante: “Hi, how are you?”, que ele repete incessantemente dezenas de vezes a cada vez que se confronta com um personagem ameaçador no longa. E põe longa nisso. Os espectadores são torturados por intermináveis 127 minutos, obrigados a aceitar que todos ali na tela estão passando por inimagináveis perigos em Mali. Mas sinceramente... parecia que eles estavam em uma joy ride no deserto do Saara, como se este fosse a Disney World.

Quer filme de aventura no deserto? Alugue o DVD de Lawrence da Arábia na locadora que é melhor negócio. Ou, nem isso. Qualquer O Vôo da Fênix ou até mesmo Mar de Fogo parecem obras-primas perto desse péssimo Sahara.